O ENSINO DA NATAÇÃO MANIPULADO POR RESTRIÇÕES
O ensino da natação a partir de uma estrutura não linear e manipulado por "restrições"
Introdução
Tradicionalmente, o ensino da natação tem se baseado na tentativa de moldar o aluno para alcançar um padrão fixo de movimento, reforçado por repetições frequentes de tarefas específicas. Embora esta abordagem tenha seu valor, recentes avanços na pedagogia e na dinâmica ecológica apontam para alternativas mais adaptativas, como o ensino pautado na manipulação de restrições. Este modelo enfatiza a exploração do ambiente, da tarefa e das características individuais para que o aluno descubra soluções motoras por meio da interação com esses fatores. Este artigo discute como essa proposta pode transformar o processo de aprendizagem na natação, incentivando uma formação mais ampla e autônoma.
Desenvolvimento
No ensino tradicional, repetições de padrões de movimento visam criar uma execução tecnicamente precisa, mas muitas vezes desconsideram variáveis individuais, como diferenças antropométricas, estilos de aprendizagem e reações naturais ao meio aquático. Esta abordagem é mais monótona e pode, em longo prazo, limitar a criatividade, a autorregulação e a adaptabilidade dos alunos, fatores essenciais para a formação de nadadores versáteis e preparados para enfrentar desafios.
Por outro lado, a pedagogia não linear, fundamentada na lógica da dinâmica ecológica, busca criar ambientes onde o aluno possa interagir com restrições – sejam elas ambientais (como profundidade ou correnteza), relativas à tarefa (como modificações na meta a ser alcançada ou na maneira de realizar a atividade) ou individuais (como o ajuste a capacidades físicas e emocionais ou na utilização do próprio corpo). Essas restrições não determinam um único padrão de resposta, mas criam um espaço para o aluno experimentar diferentes estratégias e encontrar soluções eficientes de movimento. Eu já tenho discutido sobre essa proposta para o ensino da AMA.
Por exemplo, em vez de forçar uma técnica de braçada única e rígida, o professor pode usar equipamentos ou atividades que alterem as condições normais, como pedir ao aluno para nadar em águas abertas ou com nadadeiras que ampliem a área de contato com a água. Essas práticas promovem aprendizado adaptativo, permitindo que o nadador perceba e ajuste seu movimento ao ambiente, melhorando sua eficiência e segurança.
Além disso, esta abordagem também fortalece aspectos como motivação intrínseca, controle emocional e habilidades cognitivas. O aluno passa a ser ativo no processo de aprendizado, testando e ajustando seus movimentos em vez de apenas replicar instruções previamente determinadas.
Aplicações Práticas
Para implementar esta abordagem, o professor pode adotar atividades e estratégias diversificadas, como:
- Variação de tarefas: introduzir exercícios com objetivos alterados, como nadar em diferentes direções ou a diferentes profundidades, permitindo ao aluno experimentar movimentos fora dos padrões habituais. É a variável mais fácil de manipular (porque já estamos mais acostumados).
- Exploração do ambiente: estimular a prática em contextos variados, como piscina, praia ou rio, para que o nadador aprenda a lidar com diferentes estímulos e desafios.
- Adaptação de restrições por meio do uso de materiais: usar equipamentos, como snorkel ou nadadeiras, de forma a criar condições desafiadoras, ajustando o foco na propulsão, equilíbrio ou respiração, sem direcionar exclusivamente para um único padrão ideal.
- Proponha desafios: Propor desafios para o aluno superar, como atravessar a piscina com o menor número de braçadas, incentivando a reflexão sobre eficiência e técnica.
Com essas práticas, o foco deixa de ser exclusivamente a execução técnica “perfeita” e passa a ser o desenvolvimento de habilidades funcionais e adaptativas que serão úteis aos nadadores competitivos e não competitivos em estágio de formação.
Conclusão
O ensino da natação por meio da manipulação de restrições e com uma abordagem não linear oferece uma perspectiva inovadora, priorizando a autonomia, a experimentação e a adaptação. Essa proposta não apenas amplia o repertório motor dos alunos, mas também fomenta um aprendizado mais prazeroso e duradouro, evitando a mecanização e o desinteresse que podem surgir de métodos repetitivos tradicionais. Ao adotar essa filosofia, professores têm a oportunidade de formar nadadores capazes de lidar com desafios complexos, tanto dentro quanto fora da piscina.
Sugestão de leituras
GUIGNARD, B.; BUTTON, C.; DAVIDS, K.; SEIFERT, L. Education and transfer of water competencies: an ecological dynamics approach. European Physical Education Review, v. 26, n. 4, p. 938-953,
RIBEIRO, J.; DAVIDS, K.; SILVA, P.; COUTINHO, P.; BARREIRA, D.; GARGANTA, J. Talent development in sport requires athlete enrichment: contemporary insights from a nonlinear pedagogy and the athletic skills model. Sports Medicine, v. 51, p. 1115-1122,
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