O Projeto de Pesquisa
- Postado por Guilherme Tucher
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- Data 27 de setembro de 2024
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O Projeto de Pesquisa - saiba como fazer
Se você já ouviu a expressão “Você precisa fazer o seu projeto de pesquisa”, pode ser que as lembranças associadas a ela não sejam muito boas.
Isso acontece porque nos vemos em uma situação na qual precisamos fazer algo que não sabemos fazer. E isso é horrível. E mesmo que saibamos, reconhecemos também que essa não é uma tarefa das mais simples.
Um projeto de pesquisa geralmente é solicitado por um professor quando você escreverá o seu trabalho de conclusão de curso (ao final da graduação), pretende concorrer a uma bolsa de iniciação científica ou entrar em um programa de pós-graduação.
Você pode, nesse momento, não almejar uma carreira de pesquisador. Entretanto, se você quer terminar a sua graduação escrevendo um trabalho de qualidade – e realmente aprender alguma coisa, esse é o caminho correto a percorrer.
Além disso, se você pretende entrar na pós-graduação (programa de mestrado ou doutorado) esse é um requisito obrigatório.
Como eu disse para você, essa não é uma tarefa fácil. De qualquer maneira, se você souber o que fazer e como fazer, eu tenho certeza que o caminho será menos sofrível.
O que é um Projeto de Pesquisa
Um projeto de pesquisa é um documento no qual você escreve e descreve aquilo que você gostaria estudar. Ou seja, ele tem um sentido de plano futuro.
Nele você deve, basicamente, apresentar o que já se sabe sobre um assunto, uma questão problema que mereça ser estudada e o caminho que você utilizará para resolver esse problema. Pensando assim nem parece tão difícil, certo?
E talvez não seja. Vamos lá.
A Seção da Introdução
Você pode escrever a introdução do seu projeto seguindo a mesma lógica que utilizaria para um outro trabalho acadêmico (uma monografia, artigo ou tese): venda a sua ideia.
Isso mesmo! Seja um vendedor.
Você precisa mostrar para o leitor – que inicialmente será o seu orientador ou um avaliador (no caso de processos seletivos ou de bolsa) que aquilo que você se propõe a fazer é relevante e interessante. Que é necessário!
Para que você convença os outros que o seu projeto é relevante e interessante você precisa falar a mesma língua deles. Ou seja, do seu orientador e desse possível avaliador. E eles falam a língua da ciência.
Eles discutem o que eles leem e conhecem (possivelmente); que é aquilo que está publicado sobre o assunto. Você precisa entrar na mesma sintonia que eles estão. Caso contrário vocês falarão línguas diferentes.
E sabe como você faz isso? Lendo! Lendo as mesmas “coisas que eles já leram”. Assim, antes mesmo de pensar em escrever qualquer coisa, você precisa ler o que já existe sobre o assunto.
Eu não digo que nesse momento deva ser obrigatoriamente uma leitura exaustiva sobre o assunto (mas reconheço que esse seria o correto a fazer, principalmente se pensarmos em mestrado e doutorado). Mas para que você entre na roda de conversa, precisa conhecer do assunto.
Se você não fizer isso usarão aquela expressão contra você: “pegou o bonde andando”. Ou seja, você não entende sobre o que estão discutindo. Suas dúvidas e questões já foram respondidas na literatura ou não fazem qualquer sentido.
Além da leitura, também vale uma conversa com pesquisadores e especialistas da área.
Legal, então a primeira coisa a fazer é LER.
Depois que você ler alguns artigos começará a ter ideia sobre o que já se sabe sobre o assunto. Ao mesmo tempo que você conhecerá o assunto, conseguirá identificar o que ainda não se sabe sobre esse assunto.
E é justamente por isso que o seu trabalho ganha relevância. É por isso que você merece ganhar uma bolsa de estudos ou entrar no programa de pós-graduação.
Sejamos francos! Você pagaria caro por um produto ou serviço que não é importante para você? Eu creio que não.
Se você sabe por que o seu produto é relevante para alguém, você conseguirá vendê-lo com mais facilidade (espero que você tenha entendido a analogia). E estou falando de uma venda justa – sem papo de vendedor.
Dando continuidade, se você (i) conhece sobre o assunto e (ii) identifica o que não se sabe sobre o assunto, você tem condições de formular uma questão problema. Você pode levantar uma dúvida.
O seu estudo deve justamente solucionar a essa dúvida – ou seja, você já tem o objetivo do seu estudo. Não vou me debruçar sobre essa questão aqui, mas a sua pergunta científica talvez seja a parte mais importante do trabalho.
Ela é o começo. Se você começar mal terá problemas posteriormente. Assim, certifique-se de que a sua pergunta está bem escrita, é clara e objetiva.
Seguindo em frente, são justamente essas informações que você deve passar para o papel: (i) você deve indicar para o leitor o que já se sabe sobre o assunto, (ii) deve indicar aquilo que ainda não se sabe sobre o assunto e finalmente (iii) indicar o objetivo do seu estudo (que é responder a pergunta que você elaborou).
Dentro dessa história, podemos pensar então em fazer uma introdução com quatro parágrafos:
1º – contextualização geral sobre o assunto (o que já se sabe – seja mais geral);
2º – contextualização específica sobre o assunto, mais próximo da sua questão problema (o que já se sabe – seja específico);
3º – o que não se sabe sobre o assunto, indicando a sua importância e relevância (seja muito específico); e
4º – objetivo do estudo*.
Como eu disse anteriormente, imagine-se como um vendedor. Sua introdução deve ser escrita como uma história que irá convencer o leitor da importância do seu trabalho. Como você deve convencer ao leitor, escreva pensando nele, não em você mesmo.
* alguns projetos permitem (ou exigem) que o objetivo do estudo seja apresentado como último paragrafo da introdução. Outros, entretanto, pedem que você tenha uma seção específica para apresentar o Objetivo Geral e os Objetivos Específicos. Conheça essas normas antes de começar a escrever.
A Seção da Metodologia
Depois da leitura da Introdução, a seção seguinte é a de Metodologia (esse nome varia muito, podendo ser também: Métodos, Materiais e Métodos, Procedimentos Metodológicos entre outros).
Aqui você deve descrever o caminho que será seguido para alcançar o objetivo que você indicou ao final da Introdução.
Eu costumo associar a Metodologia a receita de um bolo. A receita (Metodologia) é o passo a passo que você seguirá para fazer um bolo (solucionar a sua questão problema) – o mesmo bolo que alguém já fez.
Existe uma ordem para a realização das coisas, existem produtos específicos e, por vezes, até de marcas específicas. Você não pode assar a massa do bolo e só depois colocar o leite (creio eu – rsrsrs)!
Eu gosto de dividir a Metodologia nas seguintes partes: (i) quem será avaliado?; (ii) o que será avaliado?; (iii) como será avaliado? e (iv) qual será a estatística utilizada?
Cada um desses tópicos será basicamente um parágrafo da sua Metodologia e você deve usar um pouco de “futurologia” (mas por favor, não faça como os analistas políticos ou comentaristas de futebol).
Uma coisa importante. Como estamos falando de uma intenção de ação, os tempos verbais são todos no futuro (mas na publicação final os tempos verbais estarão no passado).
Quem será avaliado?
Voltando mais uma vez ao objetivo do seu estudo, você já tem em mente quem deve compor a sua amostra. Se o seu objetivo de estudo é “verificar o efeito de 2 semanas de polimento no desempenho de nadadores de elevado rendimento” não faz sentido ter uma amostra composta de crianças ou jovens em processo de aprendizagem. Certo?
Indique o tamanho amostral desejado (e como chegou a esse número), a forma de seleção da amostra e algumas outras características do grupo pretendido.
Possivelmente depois você fará alguns ajustes e terá informações mais precisas sobre eles. Mas para o projeto isso não é necessário.
Também é interessante indicar no final desse parágrafo que o projeto será submetido ao Comitê de Ética antes de sua realização e que as normas éticas de pesquisa serão atendidas.
O que será avaliado?
Agora você deve indicar tudo o que será avaliado e os instrumentos que serão utilizados para isso (geralmente indicando também a marca dos equipamentos).
Como será avaliado?
Nesse parágrafo você deve escrever como os sujeitos serão avaliados (o termo correto seria “como será testado”, mas deixemos isso para outra discussão).
Ou seja, como será o processo de avaliação? Suponhamos que o processo de avaliação será realizado em três dias? O que será testado no primeiro dia? E como será isso? O que será testado no segundo e terceiro dias? Descreva essas informações.
Dependendo da proposta do seu estudo vale a pena fazer uma imagem que represente toda essa proposta. Uma imagem bem-feita ajudará no entendimento dessa dinâmica. Entretanto, as informações textuais continuam sendo importantes.
Se o parágrafo anterior ficar muito pequeno, podemos unir a proposta dos parágrafos “o que será avaliado” e “quem será avaliado” em apenas um.
Qual será a estatística utilizada?
Informe ao leitor como os dados obtidos serão organizados. Como eles serão tratados para que façam sentido. Essa é a finalidade da estatística.
Geralmente indicamos primeiro a estatística descritiva, depois o teste de normalidade que se pretende utilizar e, finalmente, os procedimentos inferenciais. Você pode terminar esse parágrafo indicando o programa de estatística que utilizará.
Para facilitar a escrita da Metodologia (e isso serve para qualquer outra seção), utilize um artigo (de qualidade) já publicado. Não é para copiar o que esse autor escreveu, mas para seguir a mesma linha de raciocínio.
Outras Informações Importantes no Projeto
As informações completas de um Projeto de Pesquisa variam entre programas e instituições. De qualquer maneira, as seções Introdução e Metodologia estarão sempre presentes.
Minha sugestão é que você procure pelas normas do local onde o seu projeto será enviado.
Resultados Esperados
Não confunda “Resultados Esperados” com a seção de “Resultados” de um artigo ou trabalho científico já finalizado. Lembre-se que estamos construindo o projeto. Estamos no desenho da casa.
Aqui você deve indicar quais são os resultados esperados para o seu projeto como um todo. Depois que a casa estiver pronta, quais serão os benefícios esperados?
Você pode escrever em forma de tópico qual é (i) o impacto científico esperado para a sua publicação, (ii) os benefícios aos indivíduos participantes da amostra, (iii) o que se espera publicar e o quanto se espera publicar, (iv) se haverá participação em eventos científicos e coisas do tipo.
Lembre-se, é uma brincadeira de futurologia. Mas existe uma lógica e racionalidade para isso. Seja otimista, mas tenha noção das limitações do seu trabalho.
Cronograma
Essa informação geralmente é transmitida por meio de uma tabela. Liste os itens que precisam ser feitos na primeira coluna da tabela – sendo um por linha.
Na primeira linha da tabela indique os meses de realização do seu estudo. Um projeto de iniciação científica, por exemplo, dura um ano. Entretanto, cursos de mestrado e doutorado tem um tempo maior.
O objetivo é indicar as tarefas que serão feitas e quando serão feitas.
Exequibilidade
Demonstre brevemente que você tem condições reais de realizar o seu projeto. Geralmente se pensa em questão de tempo e recursos (de pessoal e financeiro).
Se equipamentos e materiais específicos são necessários, indique se já os possui ou como fará para obtê-los.
Mais uma vez a ideia é você provar que o seu projeto tem condições de ser realmente feito.
O seu orientador ou uma agência de fomento estarão investindo recursos em algo mais concreto e que tem condições de ser realizado.
Referências
Indique referências atuais e relevantes para o seu projeto. Como eu disse no início, as pessoas que avaliam o seu trabalho geralmente têm leitura sobre o assunto.
Eles saberão se alguma importante referência está faltando ou se algo novo foi publicado.
Em qualquer caso, entretanto, a preocupação maior deveria ser a menos importante. Apresente nas referências todas as citações que foram utilizadas no seu texto.
Nada a mais e nada a menos.
A melhor maneira de garantir isso é utilizando um gerenciador de referências tipo Endnote, Zotero ou Mendeley.
Eles não fazem milagre e devem ser utilizados corretamente. Mas com certeza são uma mão na roda.
Finalizando
Escrever um Projeto de Pesquisa (ou um artigo ou tese) consiste em contar uma história que convença os outros que o que você propõe é importante.
Você quer entrar em uma conversa que não está começando agora, então precisa saber o que já falaram sobre esse assunto (importância da leitura).
Só assim você fará uma “fala” pertinente.
Escreva para o leitor, não para você. E escreva um trabalho científico dentro das exigências dessa área. Eu não escrevo os meus artigos da mesma maneira que escrevi essa notícia para o meu site.
Cada tipo de escrita exigirá de você uma técnica diferente.
De qualquer maneira, crie a história na sua cabeça e depois venda-a por meio da sua escrita.
Eu fiz um esquema em formato de resumo para vocês. Veja abaixo
Eu tenho dois vídeos breves sobre o assunto que também podem te ajudar.
O primeiro é “Como fazer: problema de pesquisa, título, objetivo e introdução”.
O segundo, que é uma continuação, refere-se a “Como fazer: metodologia, resultados esperados e cronograma de execução”.
É docente no curso de graduação e no programa e pós-graduação em educação física da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Na EEFD ainda é coordenador do Grupo de Pesquisa em Ciências dos Esportes Aquáticos (GPCEA).
Doutor em Ciências do Desporto (2015), Mestre em Ciência da Motricidade Humana (2008), Especialista em Esporte de Alto Rendimento (2014), em Natação e Atividades Aquáticas (2004) e em Treinamento Desportivo (2005), e Graduado em Educação Física (2003).
Docente no ensino superior desde 2005, atuou ainda como professor de natação trabalhando com diferentes níveis de aprendizagem e aperfeiçoamento, bem como treinador de natação competitiva participando de campeonatos estaduais (RJ) e nacionais.