O MOVIMENTO HUMANO NO MEIO AQUÁTICO
- Postado por Guilherme Tucher
- Categorias Notícias, TOP - Natação
- Data 27 de maio de 2024
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INTRODUÇÃO
Esse breve texto tem por objetivo apresentar alguns conceitos relativos à mecânica dos fluidos, com atenção especial a água, nossa área de interesse.
Entender esses conceitos pode te ajudar a ministrar uma aula de natação melhor. Não significa que precisamos de um físico na beira da piscina, mas se você puder responder por que o tamanho e o posicionamento corporal influenciam o deslocamento do indivíduo na água, por que as pernas afundam quando estamos na horizontal e a consequência desse acontecimento na necessidade de movimentação dos membros inferiores e por que algumas pessoas flutuam mais do que outras – já está muito bom.
Esse entendimento fará você perceber o movimento corporal na água com outros olhos e possivelmente também contribuirão na correção de determinados movimentos – afinal de contas agora você entende o que está acontecendo.
VAMOS AOS CONCEITOS
FLUIDO:
- Deve-se entender que um fluido é qualquer substância que tende a fluir ou a deformar-se continuamente sob a ação de uma força de cisalhamento. Os gases e os líquidos são fluidos com comportamentos mecânicos semelhantes.
FLUXO LAMINAR:
- Se caracteriza por camadas uniformes de moléculas do fluido que fluem paralelamente umas às outras (geralmente ocorre em movimentos mais lentos).
- Possivelmente, na natação, essa percepção fica mais evidente quando o nadador realiza o deslize após uma saída de bloco ou virada. O posicionamento corporal, o ângulo de ataque e a morfologia do indivíduo favoráveis podem criar um fluxo mais laminar (ou menor fluxo turbilhonar).
FLUXO TURBILHONAR:
- Quando um objeto se movimentar com velocidade suficientemente alta em relação ao fluido circundante, as camadas do fluido próximas da superfície do objeto irão misturar-se, e o fluxo será denominado como fluxo turbilhonar. Quanto mais irregular for a superfície do corpo, mais baixa será a velocidade relativa na qual haverá turbulência. Ou seja, se houver alguma turbulência o fluxo não é laminar.
Imagem com exemplo do fluxo laminar e turbilhonar
FLUTUABILIDADE:
- Podemos afirmar que a flutuação (ou flutuabilidade) é a capacidade de um corpo flutuar em um meio líquido e essa flutuação depende da relação entre a sua flutuabilidade (capacidade de flutuar) e o seu peso (a massa do corpo).
- Flutuabilidade é a força de um fluido que atua sempre verticalmente para cima, sendo explicado pelo princípio de Arquimedes. Nele se estabelece que a magnitude da força de flutuação que atua sobre determinado corpo é igual ao peso do fluido deslocado pelo corpo.
- O “peso do fluido deslocado pelo corpo” é calculado multiplicando-se o peso específico do fluido (que no nosso caso é água) pelo volume da porção do corpo que é circundada pelo fluido (ou seja, pelo espaço do corpo que está sob a água). Assim, a flutuabilidade é calculada como o produto do volume deslocado pelo peso específico do fluido.
- Vamos a um exemplo: se uma bola de polo aquático com volume de 0,2 m3 for submersa totalmente em água, a força de flutuação que atua sobre a bola será igual ao volume da bola (espaço que ela ocupa) multiplicado pelo peso específico da água: 0,2 m3 x 9,790 N/m3, que é igual a uma força de flutuação de 1,958 N.
- Quanto mais denso for o fluido circundante, maior será a magnitude da força de flutuação. Por isso parece “mais fácil” flutuar no mar do que na piscina, pois a água salgada é mais densa do que a água doce.
- Levando-se em consideração que a magnitude da força de flutuação (força vertical para cima) está relacionada diretamente ao volume (total ou parcial) do objeto submerso, o volume necessário para gerar uma força de flutuação igual ao peso do objeto (força vertical para baixo), é o volume que fica submerso. Assim, o corpo afunda até que o seu volume seja o suficiente (se for possível) para superar a força peso.
- O ponto no qual a força de flutuação atua é o centro de volume do objeto, também conhecido como centro de flutuabilidade. O ponto no qual a força peso atua é o centro de massa. No ser humano, essas duas forças nem sempre atuam no mesmo ponto.
- Quando o peso (que atua verticalmente para baixo) e a força de flutuação (que atua verticalmente para cima) são as duas únicas forças que atuam sobre um corpo, agem no mesmo ponto e suas magnitudes são iguais (ou seja, a força verticalmente para baixo é igual a força verticalmente para cima), o corpo flutua em estado imóvel.
- Por outro lado, se a magnitude do peso for maior que a magnitude da força de flutuação (ou seja, se a força vertical para baixo for maior do que a força vertical para cima), o corpo afunda.
FLUTUAÇÃO DO CORPO HUMANO:
- A diferença na flutuabilidade dos indivíduos deve-se a densidade dos seus corpos. Para que possa haver flutuação, o volume corporal deve ser suficientemente grande para criar uma força de flutuação maior ou igual ao peso corporal do próprio indivíduo.
- A orientação do corpo humano (mais horizontal ou diagonal; em decúbito dorsal com as pernas mais próximas da superfície ou mais fundas) quando flutua na água é determinada pela posição relativa do cento de gravidade do corpo (onde atua a força peso) em relação aos seu centro de volume (onde atua a força de flutuação).
- As localizações exatas do centro de gravidade e do centro de volume variam com as dimensões antropométricas e com a composição corporal de cada indivíduo. Normalmente, o centro de gravidade fica abaixo do centro de volume, por causa do volume relativamente grande e do peso relativamente pequeno dos pulmões (do tronco).
- Uma vez que o peso atua no centro de gravidade e a flutuabilidade atua no centro de volume, será criado um torque que roda o corpo (abaixando as pernas) até que ele fique posicionado de forma que essas duas forças estejam alinhadas verticalmente e que o torque deixe de existir.
- Por isso, a posição mais comum de flutuabilidade em decúbito dorsal é aquela onde os membros inferiores estão levemente mais fundos do que o tronco. Dependendo da pessoa, o lançamento dos braços para trás permitirá que as pernas se levantem levemente, pois há um deslocamento do centro de gravidade.
- De qualquer maneira, dependendo da pessoa, essa estratégia pode não trazer qualquer diferença na sua capacidade de flutuação – pois ela possui muita densidade.
- As crianças e os idosos (principalmente as mulheres) tendem a ter uma menor densidade (pouca massa muscular e óssea) o que facilita a flutuabilidade. Os homens (devido a maior massa muscular e óssea em relação ao volume corporal) tem uma tendência natural em afundar.
Imagem mostrando a alteração no posicionamento corporal em função do posicionamento dos braços, qua altera o ponto de aplicação da força peso
RESISTÊNCIA DINÂMICA:
- Resistência dinâmica (ou drag) é uma força causada pela ação dinâmica de um fluido (que no nosso caso é o movimento da água) que age na direção das correntes livres do fluxo do fluido. Em geral, é uma força que torna mais lento o movimento de um corpo através de um fluido.
- A força de resistência (hidrodinâmica) é influenciada pelo coeficiente de resistência dinâmica, pela densidade do fluido, pela forma e posição corporal, pela área superficial do corpo orientada perpendicularmente ao fluxo do fluido e pela velocidade relativa do corpo em relação ao fluido.
- Assim, o simples posicionamento inadequado na água, por si só, já dificulta do deslocamento do nadador para frente. Da mesma maneira, a forma corporal assumida e a velocidade de deslocamento.
- A resistência dinâmica aumenta aproximadamente com o quadrado da velocidade quando a velocidade relativa é baixa. Na natação, a resistência dinâmica que atua sobre um corpo em movimento é quinhentas a seiscentas vezes maior do que a que seria observada no ar (variando de acordo com as características antropométrica do nadador e o tipo de braçada realizada).
- A resistência dinâmica passiva é gerada pelo tamanho, formato e posição do corpo do nadador na água. A resistência dinâmica passiva está inversamente relacionada com a flutuabilidade do nadador. A resistência dinâmica ativa está associada como o movimento da natação.
- Três formas de resistência contribuem para a força da resistência dinâmica total: atrito de superfície (ou atrito de resistência, resistência dinâmica de superfície ou resistência dinâmica viscosa), resistência dinâmica de forma e a resistência de onda (HALL, 2005).
- Por causa das discussões anteriores que o posicionamento corporal, a técnica e até mesmo o formato do corpo do indivíduo são tão importantes na natação (principalmente competitiva). De qualquer maneira cabe a você, a partir das particularidades do seu aluno, buscar o melhor padrão de movimento possível.
Imagem indicando que o formato de um corpo influencia na resistência (no nosso caso, hidrodinâmica) que ele sofre ao se deslocar em um fluido (no nosso caso, a água)
FORÇA DE SUSTENTAÇÃO:
- É a força que atua sobre um corpo, em um fluido, (que no nosso caso é a água) em direção perpendicular ao fluxo do fluido. É uma força que pode assumir qualquer direção, conforme for determinado pela direção do fluxo do fluido e pela orientação corpo.
- Os fatores que afetam a magnitude da sustentação são basicamente os mesmos que afetam a magnitude da resistência dinâmica (drag): coeficiente de sustentação, densidade do fluido, área superficial contra a qual a sustentação é gerada e a velocidade relativa de um corpo em relação a um fluido.
- Uma maneira de criar força de sustentação consiste em fazer com que o formato de um corpo em movimento se assemelhe ao formato de uma folha metálica.
- De acordo com o princípio de Bernoulli, as regiões de fluxo do fluido com alta velocidade relativa estão associadas a regiões de baixa pressão relativa, e aquelas de fluxo com baixa velocidade relativa estão associadas a regiões de alta pressão relativa.
- A mão humana se assemelha ao formato de uma folha metálica quando visualizada de uma perspectiva lateral. Quando um nadador desliza a mão através da água, estará sendo gerada uma força de sustentação perpendicular à palma.
- Os que praticam o nado sincronizado utilizam um movimento de remada, deslizando rapidamente suas mãos para frente e para trás, a fim de manobrar seus corpos através de várias posições na água.
- A força de sustentação gerada pelos rápidos movimentos de remada permite aos nadadores sustentarem seus corpos em uma posição invertida com ambas as pernas estendidas para fora da água (HALL, 2005).
PRESSÃO HIDROSTÁTICA:
- É a pressão que surge em fluidos estáticos, pois qualquer ponto abaixo da superfície de um fluido suporta o peso do fluido acima. A pressão hidrostática em qualquer ponto de um fluido é proporcional à profundidade daquele ponto abaixo da superfície (STAGER e TANNER, 2008).
CONCLUSÃO
Esse texto teve por objetivo relembrar alguns conceitos de hidrodinâmica que são importantes de serem conhecido pelo professor de natação – independentemente do nível de ensino que ele esteja trabalhando.
É importante que conheçamos do comportamento humano na água para propormos exercícios e atividades de aprendizagem que melhore a experiência corporal na água e, se necessário, a técnica dos nados competitivos.
SUGESTÃO DE LEITURA
HALL, S. J. Biomecânica básica. 4. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 2005.
MAGLISCHO, E. W. Nadando o mais rápido possível. 3. Barueri, SP: Manole, 2010.
STAGER, J. M.; TANNER, D. A. Natação: manual de medicina e ciência do esporte. 2. Barueri, SP: Manole, 2008.
Tag:ensino, hidrodinâmica, natação, Técnica
É docente no curso de graduação e no programa e pós-graduação em educação física da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Na EEFD ainda é coordenador do Grupo de Pesquisa em Ciências dos Esportes Aquáticos (GPCEA).
Doutor em Ciências do Desporto (2015), Mestre em Ciência da Motricidade Humana (2008), Especialista em Esporte de Alto Rendimento (2014), em Natação e Atividades Aquáticas (2004) e em Treinamento Desportivo (2005), e Graduado em Educação Física (2003).
Docente no ensino superior desde 2005, atuou ainda como professor de natação trabalhando com diferentes níveis de aprendizagem e aperfeiçoamento, bem como treinador de natação competitiva participando de campeonatos estaduais (RJ) e nacionais.
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Material de fácil entendimento, esclarecedor